estórias de segunda e sinais do universo
Anotei algumas ideias prum reels no instagram falando sobre o estórias de segunda completar um ano de lançamento. Na verdade, o aniversário foi dia 29 de julho, mas no meio das Olimpíadas nosso foco era outro, certo?
Já publiquei alguns vídeos lá no perfil sobre as inspirações, capas, ideias e conceitos do algumas e do segunda, foi divertido. Quer dizer, é! Não penso em aposentar minhas falas que sempre se iniciam com 'e aí gurizada' junto de um paz & amor na mão esquerda. O combinado que tenho comigo mesmo sobre divulgação, é »» só crie aquilo que você gostaria de ver vindo dos seus artistas preferidos ««.
E caso você já teve (vontade e) oportunidade de ler tanto os livros quanto os textos do 'mostardas', sabe que ainda tenho bastante relutância com caçar-likes, criar vídeos rápidos que são tendência e coisas assim. Eu sou velho na internet, cara. É isso. LER ou OUVIR com atenção, dedicação e paciência, ainda é vital pra mim.
Eu sei, o capitalismo a falta de tempo etc. Foda-se.
Dito isso, ao invés do reels com edição dinâmica e música de fundo, hoje eu escrevo.
Depois de ter lançado e vendido o algumas, lá em abril de 2022, o mês era agosto (ou setembro) e chegando no trabalho, estacionei o carro, abri meu insta e mandei mensagem pro Matheus Torres, que além de amigo de ensino fundamental, é um artista excelente (e meu tatuador oficial™). Lembro de ser um áudio rápido falando "bro, tudo bem? olha só, eu vou escrever o livro 2 e não sei o que vai ser, não faço ideia. mas sei que vai ter uma espada chinesa na capa. não é uma katana, é uma espada chinesa, jian. beleza? daqui a uns meses combinamos pra você desenhar."
Foi exatamente assim. Não foi estudo ou homenagem e nem tenho memória da sinapse, do raciocínio lógico ou do Eureka!. Uma jian apareceu na minha cabeça e estava decidido. Minhas referências máximas de artes marciais e cultura oriental na infância vinham de uma faixa vermelha no taekwondo, Tekken 3, O Tigre e o Dragão, Kill Bill e Tartarugas Ninjas.
Mas ela seria a capa e, me conhecendo, provavelmente tenha pensado "mais pra frente eu resolvo isso aí". No livro 1 as meias roxas são símbolos de conexão entre contos e personagens, e no segundo não foi diferente. Escrevendo, concatenando, anotando e experimentando, logo ficou claro.
Só que antes, depois do diálogo com o Matheus em agosto-setembro, esse assunto ficou adormecido. Sou meio reservado com as ideias, prefiro apresentá-las quando estão no ponto de concretização ou já prontas. Eu vim morar em Porto Alegre no dia 29 de dezembro de 2022, um dia após meu aniversário, com o carro lotado de coisas de gato, os dois pequenos nas caixinhas no banco de trás, a fotinho 3x4 da minha mãe guardada na viseira solar do motorista e um choro descontrolado na saída do pórtico. Medo, felicidade, coragem de tentar. Sei lá.
Alguns meses na capital e, num final de semana que minha família veio pra cá, pai, madrasta e irmã saíram com meu avô Elemar num domingo de manhã. Domingo de manhã, gente. Domingo de manhã se dorme. Lógico que não fui. Acordei meio-dia, escovei os dentes, fiz um café preto e vim pro computador.
Cheguei na frente da mesa e calei. Em frente ao teclado, uma espada chinesa.
O mesmo modelo que surgia visualmente nos meus pensamentos.
Fiquei quieto por um tempo pensando se havia contado a capa/símbolo para alguém além do futuro-ilustrador e não, não lembro de ter falado com nenhuma vivalma sobre. Perguntei pro meu pai pra que caralho tinha uma arma branca na minha mesa e ele respondeu rapidamente em áudio "teu avô pediu pra deixar aí pra ti, disse que comprou essa espada há uns 20 anos, uma pra cada neto e nunca lembrou de te entregar".
Nessas horas se esquece de ateísmo, ceticismo, incredulidade e afins. Era um sinal do universo. Essa era a confirmação do símbolo central da segunda obra.
(jamais perguntarei pro vô em que contexto ele parou e pensou “tá aí, vou comprar umas espadas pra gurizada brincar”.)
………mas e aí, qual seria o elo?
No primeiro livro, num café de família que virava janta, falei rapidamente pros Valdugas com tom de voz murcho e desinteressado enquanto tirava a casca de uma fatia de queijo colonial: …tô escrevendo um livro de contos. O jeito emburrecido e desinteressado era proposital. Depois que conheci meu amigo Adriano, lá em Santa Maria, percebi o quão defensiva, reativa e grossa minha personalidade era. O Adri sempre foi muito gentil e, me comparando, entendi que minha comunicação não era tão ………saudável? (saudável é o certo?) foram anos até aprender a dosar minhas palavras e lidar com possíveis críticas.
O que quero dizer é que, quando falei do primeiro livro pros meus familiares próximos, não esperava muito em resposta, talvez um boa! já fosse ótimo. O problema não era eles, visto que ficaram felizes(!), era comigo. Nesse período as coisas não iam bem e um balde de água fria a mais não seria nada produtivo.
Ser teimoso tem sido um diferencial nos meus dias. Acreditar de verdade numa parada faz com que você fique cego e burro, mas também confiante e obstinado. Eu iria escrever um livro e pau no cu de quem não gostasse.
Minha tia ficou super animada e dividi com ela que as meias roxas seriam a capa. Ela levantou do sofá, foi no armário de seu quarto e voltou dizendo “tipo essas?”, um par de meias roxas velhas e desbotadas iguais às que Thomas vestia no primeiro conto. Quais as chances? Peguei o par para usar como base de estudo para ilustração e nunca mais devolvi. Hoje — lavada —, está ali guardadinha com três livros que eram da Glaucia.
Matheus, você tangencia muito.
VOLTEMOS.
Domingo, sol, início de tarde, uma xícara de café preto e uma espada chinesa em frente ao teclado. Chamei o amigo ilustrador, contei a curiosidade, mandei fotos e vambora. Bom, eu tinha uma capa, um compromisso e um livro a escrever. Optei pelos contos “““““““avulsos”””””” primeiro, deixando Thomas e Helena para a parte final. Os personagens iam me mostrando como as coisas se desenrolavam, de onde saíram no final do livro 1 e onde estavam agora. Foi mais fluido do que pensei e mais complicado nos detalhes do que esperava.
Seus arcos se aproximavam da parte final e nada da espada se encaixar. Foi só no último conto que o significado apareceu.
Sabe aquele primeiro instrumento que você ganhou, o colar que tu herdou da tua avó, o dentinho de leite do seu filho ou o livro que você comprou pra presentar um amor e estabelecer um marco? É tipo isso. Se uma espada é feita pra cortar e ferir, no segunda ela age exatamente de modo contrário. Gosto de vê-la e usá-la contra o seu propósito objetivo. Para um personagem ela carrega traumas, mas o que impede de trazer alegrias para outro? Como eu faço isso? Como trabalhar o mesmo elemento dentro do cotidiano e do surrealismo, em famílias diferentes, em traumas e felicidades, em passado-presente-futuro? Como transformar um pedaço cortante de metal na esperança de uma criança?
Foi foda. Rolou.
É difícil revisitar o algumas e o segunda por vários motivos, mas nenhum deles é negativo. O primeiro livro é tipo o caçula — bagunceiro e meio rebelde —, o do meio é o do meio — quietinho, mais sério, discreto —, o terceiro… já virou lenda, como diz meu amigo Barbieri.
Obrigado até aqui, que venham mais duzentos anos de estórias de segunda.
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[esse texto teve apenas uma revisão rápida, não quis ter que corrigir as primeiras lembranças e significados que vieram. — e dormi mal pra caralho também, meu domingo tava terrível até começar a escrever.]
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"Eu sei, o capitalismo a falta de tempo etc. Foda-se." É disso que precisamos em qualquer arte!
"até aprender a dosar minhas palavras e lidar com possíveis críticas" continua dando pataço nas pessoas (desculpa pelo react comment in real time, tá meio inevitável e digo mais: tô me controlando kkkk)